Eu sempre comi bolas de berlim na praia. Sempre, convenhamos, nos verões em que fui à praia. A vergonha do meu corpo desaparecia, momentaneamente, no segundo em que ouvia os vendedores a anunciar a chegada das ditas. Foi um hábito que criei, sobretudo nos últimos anos, já mais velha, em que me comecei a cagar (mais ou menos) para o aspeto do meu corpo. Comia uma bola por dia. Havia dias em que comia duas. Este fim de semana estive em Tróia, onde as bolas de berlim costumam ser uma pequena categoria. Lá veio o senhor, amoroso, a apregoar as filhas da mãe. Eu respirei fundo uma meia dúzia de vezes, concentrei-me, sem grande esforço, confesso, e passei por cima da possibilidade de comer uma granda bola de berlim com creme. Eu constatei que, afinal, tenho vindo a conseguir prescindir de coisas que antes achava absolutamente indispensáveis. Afinal não são. Afinal, que vale o que vale, para mim vale tudo, sabe-me melhor sentir-me confiante, do que comer o que quer que seja. Não digo que não volte a comer, já comi uma esta estação e talvez volte a isso se me apetecer. Porém, uma coisa é certa: há em mim a certeza de que há sensações que me trazem mais felicidade do que a comida. Levei anos, mais de uma década, a aprender isto.
Sobre (novos) hábitos
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