Odeio a escola. Todos os dias tenho de lidar com estupores que gozam comigo por causa do meu corpo. Fazem-me crer que sou monstruosamente gorda, estranhamente feia. Os rapazes gozam comigo. As raparigas também. E as que mais me chamam nomes não são mais magras, nem mais bem feitas que eu. Mas juntaram-se ao grupo e eu tornei-me um alvo fácil. Vaca. Baleia. São as ofensas mais levezinhas. Todos os dias. Todos os dias. Nem vale a pena dizer aos professores: eles não se vão meter com aquela gente. Se os castigarem ainda têm de ouvir os pais e as mães deles a dizer que “nesta idade é absolutamente normal gozar-se com os outros”, que “faz parte do crescimento, da entrada na idade adulta”. NÃO, NÃO FAZ! Eu tenho o direito de estar na escola e aprender em paz. Ou será que não tenho?

Não tenho coragem de contar isto aos meus pais. Tenho a certeza que se o meu pai souber vai à escola dar uma cabeçada nos meus colegas e ainda se mete em trabalhos. Eu não quero isso. E a minha mãe? Não quero que se enerve. Eu aguento mais uns meses disto. As férias da Páscoa estão quase a chegar e o 3.º período passa num instante. Até pode ser que eles se cansem de gozar comigo, que encontrem outra distração. O pior de tudo é que as miúdas que eu julgava serem minhas amigas se juntaram a eles. São umas cobardes. “Temos medo deles, Joana”, dizem-me elas por mensagem. “Amanhã não vamos contigo para a escola.” Logo amanhã, que é dia de educação física. Vou ter de me equipar nos balneários. Vou ter de correr à volta do campo. Vou ter de fazer parte da equipa que for a última a escolher.

Odeio a escola. Mesmo assim, tenho conseguido manter as notas e isso irrita-os. Mesmo assim, continuo a ter a atenção dos professores, que investem em mim. Mesmo assim, vou à escola todos os dias e enfrento-os de novo a cada manhã. O que será da minha vida quando o 7.º ano acabar? E o 8.º? E o 9.º? Será que terei de os continuar a ver? Acho que alguns vão chumbar e desistir da escola. Talvez nunca mais tenha de os ouvir. Talvez um dia até possa passar por eles e sentir-me bem comigo. Isso ia deixá-los tão furiosos…

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